a r q u i v o

22.11.02

Ressonância magnética ou a paranóia da claustrofobia

O clínico-geral me aconselhou a tomar dois Frontal – aquele ansiolítico faixa preta. O ortopedista declarou que ele próprio só conseguia fazer esse exame com duas doses de whisky na cabeça e tapa-olhos de avião. Quando marquei a data, me contaram a história de um cara que não conseguiu ficar no tal tubo até o fim; ele nem tinha aflição de lugar fechado e mesmo assim jogou a toalha...

O pior é que antes dessas fofocas todas, eu tinha até simpatia pela ressonância magnética. Não tem que engolir câmeras, levar espetadas na veia, tomar 15 litros de água – é um exame mais pra Star Trek do que pra Idade Média. Mas com as más influências todas, cheguei no laboratório querendo ir embora. Meu estado psicológico era o da mocinha que o vilão amarra no trilho do trem. Ia entrar deitada num túnel infinito, escuro, abafado, estreito, rente ao nariz. Poderia pedir pra sair no meio, mas daí, a-ha, o exame teria que recomeçar do zero...

Pra melhorar, o assistente preparador me crivou de perguntinhas banais do tipo, você já levou tiro, tem pinos pelo corpo, clipes de aneurisma, marcapasso, e outras coisas de cyborg? Não, não, não, mas tenho restauração de metal no dente, pode??? Pooode. Só que da cabine das perguntas eu encarava a porta fechada da sala de exame, grossa que nem cofre de banco, exibindo um textão do tipo KEEP OUT! Só faltava a caveira com dois ossos cruzados. Em compensação, tinha o desenho de um imã-ferradura gigante, igual desenho animado. Ah... Hahaha, imagina – a pessoa com pinos e clipes entra na máquina mortífera e gruda imediatamente no imã-gigante – KLÃN!

Foi com essa fantasia nervosa que entrei na sala, só que pra meu espanto, espanto! A máquina é linda! Uma meia argola gigante, parecendo uma florzona espessa, cor de creme, com detalhes em cinza-claro, com o logão redondo da GE carimbado em baixo-relevo. Imagina uma máquina desenhada por um arquiteto, em vez de um engenheiro. Por aí. Só a beleza salva! O furo da argola é o túnel, que não chega a dois metros de comprimento. Um tuninho... Looney tooninho. Você deita numa maca, que desliza pro túnel. O teto fica perto da sua cara, mas nem tanto.

Só que antes me botaram um tapa-ouvido – Ei! Essa parte eu não sabia – É que a máquina faz barulho... Ãhn... Putz, deve ser um barulho do inferno. Bem, de fato é um barulhão mesmo! Mas como a florzona iluminada já tinha transformado tudo em diversão, achei que parecia música eletrônica experimental ou talvez uma base pra um rock industrial. Contei mais de 15 ruídos diferentes, em ritmos diferentes. Tem barulho pequeno, grande, seco, molhado, metálico, com eco, alarmes, sirenes, assim:

muõmuõmuõmuõmuõmuõmuõmuõmuõmuõm

kri-kró
kri-kró
kri-kró

ta-ta-ta-ta
ta-ta-ta-ta ta-ta
ta-ta-ta-ta ta-ta
ta-ta-ta-ta

UÁ-UÁ-UÁ-UÁ-UÁ-UÁ-UÁ-UÁ-UÁ-UÁ-UÁ-UÁ

bim-bom
bim-bom
bim-bom
bim-bom

BÓM! BÓM! BÓM! BÓM! BÓM! BÓM! BÓM! BÓM!

mmmmmmmmmmmm mmmmmmmmmmmm

trrah-tatatá
trrah-tatatá

ctãctã
ctãctã ctã ctãctã ctãctã

Como disse pra um amigo outro dia, se tem que encarar, prefiro invocar o Roberto Benini do que o Fassbinder...

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