a r q u i v o

28.2.03

Andei consultando um texto do vô Freud, O mal-estar na civilização, publicado em 1930. Sensacional. Ele diz que fazer parte de uma civilização significa ser infeliz, de saída, e sempre. Por que? Porque para nós, seres humanos, a felicidade equivale à satisfação do instinto. Toda vez que o mundo externo se recusa a satisfazer nossas necessidades, nós sofremos. Ou seja, alguém duvida que a gente sofre praticamente o tempo todo?

“O sofrimento nos ameaça a partir de três direções:”

1) do nosso próprio corpo, "condenado à decadência e à dissolução"
2) do mundo externo, “que pode voltar-se contra nós com forças de destruição esmagadoras e impiedosas”
3) de nossos relacionamentos com outros seres humanos. Isso é talvez o mais penoso de tudo.

“... o que decide o propósito da vida é ... o programa do princípio do prazer. Esse princípio domina o funcionamento do aparelho psíquico desde o início. Não pode haver dúvida sobre sua eficácia, ainda que o seu programa se encontre em desacordo com o mundo inteiro, tanto com o macrocosmo quanto com o microcosmo. Não há possibilidade de ele ser executado; todas as normas do universo são-lhe contrárias. Ficamos inclinados a dizer que a intenção de que o homem seja “feliz” não se acha incluída no plano da “Criação”.
O mundo conspira tanto contra nós, que gastamos muito tempo fugindo do desprazer. Tanto é assim, que o Freud fez uma lista das estratégias de defesa que a gente usa para tentar evitar a infelicidade. Todas são estratégias de afastamento da realidade, da mais leve pra mais total.

Isolamento voluntário
Manter-se afastado das outras pessoas traz felicidade através da quietude.

Intoxicação química
É o método mais grosseiro e mais eficaz. “... existem substâncias estranhas, que quando presentes no sangue ou tecidos provocam em nós sensações prazerosas ... o serviço prestado pelos veículos intoxicantes na luta pela felicidade e no afastamento da desgraça é tão altamente apreciado como um benefício, que tanto indivíduos quanto povos lhes concedem um lugar permanente na economia de sua libido.”

Aniquilamento dos instintos
“... tal como prescrito pela sabedoria do mundo peculiar ao Oriente e praticado pelo ioga.”

Deslocamentos de libido
“... produção de prazer a partir das fontes do trabalho psíquico e intelectual. Quando isso acontece, o destino pouco pode fazer contra nós... por exemplo, a alegria do artista em criar ... ou do cientista em solucionar problemas ...”

Vida da imaginação
“... a satisfação é obtida atraves de ilusões, reconhecidas como tais, sem que se verifique permissão para que a discrepância entre elas e a realidade interfira na sua fruição.”

O eremita
“... o eremita rejeita o mundo e não quer saber de tratar com ele.”

O louco
“... pode-se tentar recriar o mundo, ... construir um outro ... no qual os aspectos mais insuportáveis sejam eliminados e substituídos por outros mais adequados aos nossos desejos. Mas quem quer que, numa atitude de desafio desesperado, se lance por este caminho em busca da felicidade, geralmente não chega a nada. A realidade é demasiado forte para ele. Torna-se um louco; alguém que, a maioria das vezes, não encontra ninguém para ajudá-lo a tornar real o seu delírio.”
Se você não se identificou com um bom punhado de itens, ou você veio de outro planeta ou está precisando de um divãzinho básico.

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